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AFINAL, O QUE É CONTATO?

 

   Contato é uma palavra muito usada nos círculos de psicoterapia corporal e nas abordagens que consideram importante a percepção do corpo e suas manifestações.

   Quando comecei a estudar psicologia, acreditava que o entendimento de “contato” havia sido desenvolvido na Gestalt-terapia, porém, antes desta abordagem existir, Wilhelm Reich já falava sobre a sua importância.

    Vale lembrar que o criador da Gestalt-terapia, Fritz Perls (1893-1970), foi aluno e paciente de Reich, tendo a oportunidade de aprender na prática e na teoria, as considerações de Reich sobre resistência de caráter, as manifestações corporais dos conflitos neuróticos etc.

   Quando falo em “contato”, dentro do entendimento da psicoterapia corporal, falo sobre um determinado tipo de relação. Nesse sentido, contato seria o processo psíquico e/ou comportamental pelo qual o indivíduo entra em relação consigo, com o outro e com o mundo. Implica em estar aberto às relações para que se perceba o ritmo da vida.

   Contato é ampliar a fronteira além daquilo que conhecemos, criar movimento interno em direção ao externo e vice-versa, abertura em direção ao novo, autoconhecimento e consciência de si, do outro, da natureza e do universo. Contato é possibilitar a descoberta e a comunicação.

   Desde o útero, estabelecemos uma relação de reciprocidade em que somos afetados e afetamos, somos influenciados e influenciamos um ao outro. Desde que nascemos somos um ser do contato e para o contato. O desenvolvimento humano entrelaça diversas histórias de vida, sendo resultado de múltiplas coexistências, onde todo fenômeno psicológico emerge da relação entre dois ou mais organismos, da troca emocional vivida no campo experiencial entre seres. O caminho do desenvolvimento é, portanto, o caminho dos encontros e desencontros relacionais com um Outro significativo.

   Nos desenvolvemos na interação, na comunicação, no encontro com o outro. Essa interação se dá a partir do reconhecimento e da aceitação. Contato também é confiança, transparência e entrega.

   Tudo isso serve para o cliente e também para o terapeuta, pois é necessário contato para escutar além do conteúdo das palavras. É preciso perceber a forma, o som, o tom, a intensidade, a música que as frases emitem, suas notas secretas, as hesitações ao falar, a empolgação, a dor, a contração, tanto na voz quanto no corpo, em todas as expressões. O corpo realmente fala e quando a boca consegue expressar todo o desconforto, o corpo sara. Perceber isso é contato.

   Contato é percepção, relação, troca, movimento, energia, bioenergia, emoção, transformação, conhecimento, crescimento, identidade, reconhecimento do outro, liberdade.

   Além de todas essas observações que parecem subjetivas, Reich utilizou o conhecimento da biologia para explicar a importância do contato na vida humana considerando a percepção das nossas correntes vegetativas.

    A partir do trabalho da análise do caráter, Reich descobriu que os distúrbios emocionais estão associados às disfunções biológicas e formam uma unidade funcional em constante interação. Às disfunções corporais ou musculares, Reich deu o nome de couraça. Essa couraça pode agir no nível muscular, psíquico e no sistema nervoso vegetativo.

   O sistema nervoso vegetativo ou sistema nervoso autônomo, corresponde ao sistema nervoso simpático (contração, aceleração, angústia, estresse) e parassimpático (expansão, relaxamento, prazer, alegria). Esses dois sistemas controlam funções como respiração, circulação do sangue, temperatura do corpo, digestão, pressão arterial, excreção, respostas reflexas, musculatura lisa e movimentos peristálticos (dos órgãos). Ou seja, entrar em contato com o próprio corpo e suas sensações, nos ajudaria a deixar nossas couraças menos rígidas facilitando o funcionamento do organismo e a saúde.

   E o que isso tem a ver com o psiquismo?

   Reich nos explica que “a neurose não é somente a expressão de uma perturbação do equilíbrio psíquico..., é também a expressão de uma perturbação crônica do equilíbrio vegetativo e da motilidade natural.”

 

   “... a estrutura psíquica é ao mesmo tempo biofísica (ou psicofísica) que representa um estado específico indicativo da interação das forças vegetativas de uma pessoa.” (A função do Orgasmo, pag. 255)

 

   Estar em contato com nosso funcionamento psicorporal é estar em contato com a vida e com a saúde, possibilitando um maior equilíbrio individual e social. Desde o nascimento temos impulsos em direção à vida saudável, ao amor, às sensações prazerosas. A repressão que nos é imposta ao longo do desenvolvimento faz com que esses impulsos primários saudáveis sejam, aos poucos, substituídos por impulsos secundários não-saudáveis. Exemplo disso é o (a) adolescente que teve sua sexualidade reprimida e que, em determina momento, passa a se isolar e a investir sua energia em pornografia. A pornografia é a negação do contato com o outro, é a transformação do outro em objeto. Ao considerar a relação pornográfica como algo natural, o adolescente passa a desenvolver impulsos sádicos e passa a se relacionar de maneira fria e sem contato amoroso. Tratará as pessoas como objeto e desenvolverá comportamentos autoritários. Não saberá se relacionar porque a referência de contato que ele (a) tem é a referência pornográfica. A pessoa com impulsos sádicos não tem como base o amor, mas sim o interesse.

   A mesma coisa acontece com o adulto. Muitas vezes a pessoa tem um bom relacionamento com o (a) parceiro (a), mas devido a alguma insatisfação passa a procurar outros estímulos porque deixa de entrar em contato com o parceiro (o). Se essa pessoa encontra pornografia, passará a fantasiar coisas que, provavelmente, irão levá-la a trair o companheiro (a). Esse é o resultado da falta de contato em um relacionamento amoroso.

    A pessoa que está em “contato” vai saber ser sincera com o outro, falará sobre seus desejos e insatisfações, procurará junto com o outro, formas de deixar a relação mais interessante e, JUNTOS, descobrir como deixar a relação mais prazerosa e atraente para ambos e, JUNTOS, descobrir que contato é o amor que ficou escondido embaixo da poeira das ilusões.

    Contato é vida, sexo, paixão, amor, verdade, emoção...

   A intenção do texto foi mostrar que estar atento (a) ao contato é estar atento (a) às formas naturais de se viver, é sentir corpo e mente e ser sincero consigo e com o outro.

 

Abraços

 

Alexandre Salvador

Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta Corporal

CRP-05/46554

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